A velocidade com que você come é fundamental

Pois é, muito se fala sobre “o que” comer, como tais e tais alimentos te beneficiam e outros tantos te fazem mal. Todo mundo ouve isso por todo lado. Muito válida toda essa avaliação e necessária. Inclusive aqui no site temos uma matéria sobre quais alimentos são benéficos para o cérebro e como que cuidar de sua dieta de maneira responsável e disciplinada  é imprescindível para uma vida melhor.

                Mas, mesmo sendo relacionado também à alimentação, o tema central aqui é outro. Vamos falar do jeito que você come e não do que você come.

                Comer é uma das coisas que mais fazemos na vida, óbvio. Temos um hábito já inconsciente e automático do modo que pegamos no garfo, o jeito que mastigamos, a dança particular da mandíbula e a velocidade com que esvaziamos o prato – eis o ponto importante aqui para nós.

                A percepção da quantidade de comida no seu prato é diretamente proporcional à sua percepção de tempo. Você avalia se um prato tem muita comida ou não, baseado no tempo que você vai gastar para esvaziá-lo, mesmo que seja – e sempre é – de forma inconsciente. Tem menos a ver com tamanho da fome e sim com tempo de esvaziamento.

                Temos uma epidemia de obesidade no mundo justamente porque nossa percepção de tempo mudou muito. Tudo hoje em dia parece que tem que ser rápido, estamos sempre com a sensação que estamos perdendo alguma coisa ou que precisamos escapar de alguma coisa.

                Sua percepção de tempo atua na velocidade que você come. A velocidade com que você come tem efeito imediato na percepção da quantidade de alimento no prato. Ou seja, para quem come rápido, um prato precisa de muita comida para durar 5 minutos. E aí você – pilota de fórmula 1 de prato – se encontra de repente novamente no vazio… O prato ficou vazio em 1 minuto! Claro, aí você quer mais…

                Mas a fórmula é a seguinte: menor velocidade, maior saciedade.

O segundo ponto importantíssimo é o prestar atenção… Fiquei horrorizado de observar que sempre que estou mastigando já estou pegando mais ao mesmo tempo, e mais atento ao pegar mais do que no que já está na minha boca.

                Faça um teste prestando atenção: enquanto você mastiga o alimento, você já está pegando outra garfada, está concentrado em mais. Sua mão nunca larga o garfo e assim que o alimento já está na sua boca sua atenção vai para o ato de pegar mais. Existe uma percepção sutil aí que parece boba, mas não é.

                Tente mudar isso. Assim que você colocar a comida na boca, largue o garfo se necessário. Concentre-se no que já está em sua boca. Total atenção ao gosto, até ele ir diminuindo e acabar. Toda sua atenção e devoção ao gosto, ao sabor. O impulso automático de o garfo ir buscar mais deve ser freado, volte sua atenção para o gosto apenas. Só existe o gosto…

                Até ele acabar…

                Segundo os indianos, quanto mais você sentir esse sabor do pedaço que pegou, mais prana você retira dele pra você. Prana e Chi, energias vitais fundamentais para nos sentirmos felizes e dispostos e bem alimentados. Espere o sabor sumir na boca. Veja que ele dura muito mais do que sua ansiedade jamais permitiu degustar. Vá até ele acabar, perceba a diminuição da intensidade até sumir. Aí sim, só aí, vá atrás de outro pedaço.

                  Outro ponto muito importante: perceba quanto de sabor existe num pedaço bem pequeno daquilo que você está comendo. Se você colocar um pedaço muito maior, o gosto não cresce. Você pode extrair o mesmo sabor de um pedaço bem menor. Ou seja, mais prana/energia por milímetro cúbico do que está no seu prato. Se você engolir um pedação, a ingestão de prana vai ser a mesma da do pedacinho, mas muito mais  calorias iram entrar, prontas a inflar seu já saliente pneu na cintura.

                Brinque com isso. Pegue um pedaço do pedaço do pedaço de um brownie, ponha na boca e concentre-se no sabor. Largue o garfo e feche os olhos. Sinta como o sabor sai forte daquele mini pedaço. Sinta que delícia. Sinta que naquele momento só existe aquele sabor. Perceba como é potente mesmo naquele ínfimo pedaço, ínfimo apenas se comparado ao que você está acostumado. O pedaço do pedaço do pedaço é incrivelmente potente e pode passar a ser o que você chama oficialmente de “o pedaço”. A percepção pode mudar muito do que é muito o que é pouco quando nos baseamos no sabor. O sabor e o tempo também estão correlacionados.

                Agora olhe para sua colher/garfo e comece a usar um quinto dele. Não precisa lotar todo o espaço disponível como você sempre fez. O alimento pode vir só na pontinha, já está ótimo.  Menos no garfo/colher, é mais gosto por milímetro cúbico… Agora que você sentiu a potência do gosto de um mini pedaço, você encara a colher/garfo como exageradamente grandes, e passa a preencher apenas um quinto.

Fazemos coisas ainda mais desrespeitosas ao milagre do sabor em nossa boca. Fragmentamos nossa atenção entre mil coisas ao mesmo tempo. Vemos televisão junto, conversamos junto, olhamos no celular junto e pensamos na morte da bezerra junto. O sabor fica lá no fundo, soterrado embaixo de tudo isso, com uma potência muito menor por não darmos a devida atenção. O sabor que normalmente é um berro supersônico, vira uma vozinha rouca e inaudível… E aí, é claro, precisamos de muito mais, terminamos a refeição já famintos…

                Uma mágica boba, mas interessante vai ocorrer. Se você diminuiu drasticamente a velocidade com que come, passou a largar o garfo para se concentrar totalmente no que está na boca e não no mais a se pegar no prato, passou a trazer à boca um pedaço muito menor do que antes, preenchendo apenas um quinto da colher/garfo e  desligou a TV… Aí você vai olhar para um prato muito cheio e pensar: pelo amor de Deus, vou levar horas para terminar isso. A mesma quantidade que antes você olhava e pensava: vou terminar logo pra poder repetir…

                Repetindo: sua percepção da porção no prato está diretamente ligada ao jeito que você come. O jeito que você come está profundamente ligado aos seus ritmos e sua capacidade mental de se concentrar no que faz. Tempo e espaço são medidas internas, partem de nós…

                A ansiedade com que fazemos as coisas hoje em dia faz tudo parecer pouco. Os pratos aumentaram, os copos aumentaram… Enchemos tudo com todos os tipos de alimento, pois a variedade também aumentou muito. Mas a fome também aumentou e a saciedade diminuiu. Como pode?

                O país mais rico do planeta, os Estados Unidos, tem um problema enorme de obesidade. Pensem nos termos “fastfood” e “time is money” e vocês entenderão bem da onde vem o problema.

                Estamos sempre tentando regimes que tem como meta restrição de calorias… Mas o modo que é feito é errado. Não é só quanto e o que comer, mas como… Não esquecer da relação tempo e espaço é fundamental.

                Parece óbvio e meio besta falar uma coisa dessas, mas a coisa é mágica. A velocidade e percepção de tempo faz as pessoas ficarem mais gordas e continuar com fome. A pressa é inimiga da perfeição. A pressa é inimiga de uma boa alimentação. A pressa é uma má interpretação da vida. Existe uma perpétua sensação de duas coisas: de que algo ruim está para acontecer e de que poderíamos estar curtindo mais a vida naquele momento. Coma como se nada mais existisse antes ou depois. Como se todas as contas estivessem pagas e o que você mais queria no mundo era justamente estar ali comendo.

              Só existe essa refeição nesse momento. É um privilégio enorme sentir esse sabor único…

                Pode parecer bobo e estraga prazeres demais, mas comece a marcar quanto tempo você demora para comer normalmente. Fiquei besta nas primeiras vezes que marquei. Eu devorava minha refeição em menos de cinco minutos… Achei absurdo. Muitas vezes em dois minutos. Um almoço ou um jantar ser só isso? De dois a cinco minutos?

                Comecei a traçar metas de não terminar meu prato em menos de dez minutos. Depois vinte. E fez muita diferença no meu peso, na minha satisfação com comida e outras abrangências muito interessantes, pois a coisa vaza para todos os setores da vida.

                Claro, eu sou o primeiro a dizer que adoro comer com os amigos, vendo séries de TV, pensando em bobagem, com o sabor meio perdido no meio disso tudo… E ainda confesso que muitas vezes é gostoso preencher a boca com uma colherada cheinha de sorvete e não a chatice do “só um quinto”… Ok, não precisa parar de fazer isso para sempre. Faça tudo isso recomendado aqui em algumas das refeições do dia, separe algumas ou ao menos uma delas para isso. Você se alimentará bem mais com bem menos, essa é a mágica.

                Tempo e gordura, gordura e tempo… Espaço/tempo.

                Comer é um ritual bonito, ou melhor, pode ser um ritual bonito se você lhe der a devida reverência. E de quebra você se alimentará num nível muito mais profundo, com bem menos. A coisa do emagrecer é a menos relevante aqui, mas obviamente vai acontecer, fazendo com que seu corpo tenha mais energia disponível e não perdendo a toa tendo que digerir quantidades desnecessárias de alimento que você comeu porque é apressado e sem concentração.

                Mudar o jeito de comer pode mudar sua vida por completo. Um ritmo mais lento indica ao cérebro que estamos mais satisfeitos, com mais confiança de que tudo está bem e que naquele momento não há absolutamente nada faltando. E como comer é uma das atividades que mais fazemos, fazer com consciência e consistentemente mais devagar terá um efeito em todas as outra áreas da vida. Além disso, podemos, enquanto nutrimos o corpo, nutrir uma sensação de bem estar, ao mesmo tempo. A falta de pressa vai junto com o alimento goela a baixo e realmente alimenta num nível muito mais profundo.

                Poderíamos batizar esse regime de “regime zen”. Ou talvez “regime da devoção”. Mas prefiro “regime do tempo”. Diminua a pressa e aumente a satisfação.

                Vamos comer?

A percepção da quantidade de comida no seu prato é diretamente proporcional à sua percepção de tempo. Você avalia se um prato tem muita comida ou não, baseado no tempo que você vai gastar para esvaziá-lo, mesmo que seja – e sempre é – de forma inconsciente. Tem menos a ver com tamanho da fome e sim com tempo de esvaziamento.