Fátima – Sem o lado direito

Paciente de número 85 do livro Aberrações Genéticas Extraordinárias

Fátima vive de uma forma muito estranha. Seu mundo só existe do lado esquerdo. Ela não consegue andar para a direita porque para ela esse lado simplesmente não existe. E quando estamos em sua presença, ele não existe para nós também. Ninguém consegue ver o rosto do lado direito de Fátima. Você pode correr ou fazer a força que quiser, mas ninguém fica á direita dela. Quando tentamos, andamos sem sair do lugar, como se houvesse uma barreira invisível impedindo a passagem.

O pior é que quando Fátima caminha um pouco para a esquerda, a parte da direita vai sumindo. Ela está sempre entre o lado esquerdo e o nada. Como entrou pelo meio de meu consultório, imediatamente tive que me contentar com metade dele, o lado direito sumiu. Uma mesa inclusive ficou pela metade, equilibrando-se só com dois pés esquerdos e o nada. Fátima avisou que não caminharia mais à esquerda senão ficaríamos num ambiente cada vez menor. Se ela encostasse na parede esquerda, o consultório viraria um corredor que só cabe um corpo de largura.

Disse que não conseguia viver num mesmo lugar mais de uma noite. Estava sempre caminhando para a esquerda, portanto todo os lugares que esteve antes à direita sumiam. Teria que dar a volta no planeta todo pra voltar aos lados direitos que passou. Pelo menos isso era possível por a Terra ser redonda, porém impraticável a toda hora. Não podia tomar um avião, pois suas constantes flutuações a direita e esquerda, faziam com que se perdesse no ar, pois com ela dentro, a direita ia sempre sumindo. Comecei a consulta da seguinte forma:

-A senhora têm olhos no lado direito?

-Se os tenho não sei, não enxergo nada e não posso tocar com minha mão. Posso fazer a força que quiser,mas minha mão não vai até meu lado direito.

-Quando está na rua, como as pessoas ao seu redor fazem para ir para o lado direito?

-Minha influência pelo que dizem se estende por uns dez metros à frente e dez metros à trás, não mais do que isso. Eu como estou sempre dentro desse perímetro, me dou sempre mal. Estou sempre colada em mim mesma.

-A senhora pelo menos tem bom humor.

-Não falei isso com humor não, mas com muita tristeza!

-Desculpe.

-O senhor não deve conseguir imaginar o que é viver sem o lado direito. Minha vida é uma desgraça. O senhor sabe que nossa próxima consulta não poderá ser aqui. Caminharei à esquerda para procurar um lugar pra comer, e aí, o seu consultório sumirá, pois estará à minha direita. Nunca posso voltar, mas só ir, ir, ir.

Continua…

Fátima caminha um pouco para a esquerda, a parte da direita vai sumindo. Ela está sempre entre o lado esquerdo e o nada. Como entrou pelo meio de meu consultório, imediatamente tive que me contentar com metade dele, o lado direito sumiu.