A obra é formada por relatos supostamente verídicos das consultas dos pacientes de um fictício psicólogo que seria ele então o autor e o narrador do livro. Cada capítulo conta a história de um desses indivíduos que foram tratados por ele e descreve seus problemas e características peculiares, seguidos pelo tratamento e solução que deu ao caso. As ilustrações conformam os textos e os textos conformam as ilustrações, importantes em igual medida formando um todo indissociável. A forma física dos personagens, demonstrada através das ilustrações, implicitamente contém o problema retratado no texto, tornando-se um símbolo pictórico de determinada característica psicológica aberrante, que em verdade, o leitor vai percebendo aos poucos, nada tem de aberrante, sempre se tratando de algo comum a todas as pessoas. Por meio desse disfarce, das ditas “aberrações” e das absurdas formas físicas dos personagens, o livro aborda por detrás problemas humanos bem conhecidos, mas que se “tratados” podem levar o indivíduo a afirmar-se sem medo como uma aberração, no sentido de ser alguém único, demonstrando que a característica mais aberrante negativa de todo ser humano é a conformação de toda uma personalidade exuberante e esplendorosa em prol de um senso comum, o comumente aceito, enclausurando e abandonando aquilo que se é. Essa é a brincadeira constante da obra: aberração e o comum, o comum e a aberração, ora disfarçados ora explícitos, ora como defeito ora como qualidade, numa dicotomia óbvia e dissimulada ao mesmo tempo, um tornando-se o outro incessantemente.
O livro é um canto de liberdade, uma provocação, um manifesto contra o indivíduo que traiu a si mesmo para travestir-se de normal. Aborda as várias facetas da sórdida maneira em que as pessoas vão abandonando o que realmente são ao longo da vida, mumificando-se em algo previsível e medíocre. O livro procura ser em si, intrinsecamente, aquilo que prega: uma aberração no meio de todos os outros livros, inclassificável, romanticamente grotesco, propulsor de uma nova espiritualidade, não seguindo aquilo que se espera de gênero literário algum.
Por vezes um livro de auto-ajuda “mal educado” disfarçado de ficção surrealista, por outras um livro cômico e nonsense camuflado com ensinamentos ancestrais, a pessoa que lê logo desiste de rotular e represar esse vertiginoso fluxo de “tudo ao mesmo tempo”, e deixa-se levar ao sentir a ressonância com seu eu aberrante porventura adormecido, uma cócega boa de dentro para fora, uma vontade de saborear o extra-ordinário em si e no mundo.
Após perceber que cada história se refere a problemas também seus, o leitor deixará de ver aquelas estranhas figuras como algo absurdo e alheio a si, pois descobre que as carrega em seu íntimo e elas passam a funcionar então como lembretes constantes de características e modos de agir que os prendem ou os libertam de uma sórdida pequenez já pré-estabelecida pela sociedade e que poucos escapam. São placas indicando uma viagem ao exuberante ou ao aborrecido, dependendo das escolhas de quem caminha.
Alguns casos são óbvios e certeiros em seu significado e consequência, outros desafiam o leitor por sua subjetividade e abstração, podendo conduzir a conclusões simultaneamente variadas e únicas dentro do universo individual de cada um. Acima de tudo uma obra que diverte imensamente pela sua inventividade e bizarra alegria (alegria bizarra?).
Que o monstro interno de cada um desperte e apavore o mundo… (no melhor dos sentidos).
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