Crescendo com os Filmes

De Barney a Edward Cullen

Vocês já notaram o estranho fenômeno que acontece quando assistimos um filme ou desenho com uma criança que amamos? Jamais veríamos aquilo se estivéssemos sozinhos, mas junto com ela aquela coisa tão infantil e bobinha às vezes nos é incrivelmente divertido, bonito e interessante? E a questão é, muitas vezes não estamos fingindo, forçando gostar. Algo muda na gente, nosso olhar se transmuta para uma coisa mais pura, mais inocente, que ainda está lá em nós adormecido. A união da pessoa adulta com aquele serzinho pequeno é tão grande que enxergamos através dela e com ela. Tudo se transforma em algo mais doce e verdadeiro… e muitos filmes passam a ser tudo o que não eram antes.

Já me vi cantando Barney com emoção com minha sobrinha. Aquele bicho rosa sem sentido fazia todo o sentido do mundo pra mim. Mas chegou um dia em que falei para ela: “Vamos ver Barney? “ e ela fez cara de horror tipo “Eu não quero ver essa bobeira”. Chegara a hora das Barbies… Barney já se tornara muito infantil para ela e eu tinha que me conformar e crescer junto: o máximo agora era os filmes das bonecas, que tinham longos cabelos para pentear e lindos vestidos para vestir. Ela já era uma menina de verdade e prestava atenção nos príncipes.

Superei o trauma de que o Barney não era mais importante e me tornei um fã das princesas loiras. E eu curtia aquele 3D mal feito de verdade. O olhar dela era meu e um só comigo. Lembro de ver a Barbie como Rapunzel e achando lindo que ela pintava quadros que viravam realidade… Aquilo me mostrava que é o espectador que dá a graça muitas vezes da coisa. Eu entrava naquele mundo levado por uma criança que ainda não fazia a distinção entre sonho e realidade. Cada risada de minha sobrinha era minha também e o filme se tornava algo mágico mesmo com os poucos recursos que tinha porque para ela era perfeito e isso o fazia perfeito. O jeito que ela “pintava” o quadro na tela da TV com seu olhar tornava a fantasia palpável, substancial… Assim que o filme acabava ela queria ver de novo. A repetição para ela jamais era tediosa. Ela se apaixonava mil vezes e ria mil vezes da mesma coisa… Sabia os diálogos antes que o personagem falasse… e o mais importante, via tudo com total presença e imersão. Jamais via o artifício da coisa por detrás… era real como a própria vida. Não há jeito melhor de curtir um filme! Saber se deixar levar numa história como uma criança faz é uma magia que recuperamos na presença delas. Nós adultos que não nos deixamos levar nem pela nossa própria história, a vida real, sempre com a cabeça em outro lugar dizendo que devia ser mais isso mais aquilo, mais bela, mais rica, e as pessoas mais isso e mais aquilo, que está tudo mal feito….
Tive que superar mais um trauma: chegou um dia que ela começou achar aqueles filmes da Barbie uma bobagem sem fim… Fiquei com cara de bobo quando a convidei para mais uma sessão de Barbie como Rapunzel… poxa, era tão bonito! Que pena…
Chegara a hora de um príncipe de carne e osso! Ele veio do musical “High School Musical”! Tive que me reinventar por completo. Agora eu estava de volta à escola. Dançava as músicas do High School no joguinho deles do Wii da Nintendo. Me divertia muito, que ridículo… Minha sobrinha suspirava pelo Troy vivido pelo ator mirim Zac Efron… e eu suspirava por Gabriella vivido por Vanessa Hudgens!!!
Mas o dia deles também chegou. Eu estava embalado para mais uma sessão de High School quando vi de novo aquela cara de tédio nela… Tentei argumentar com horror: você não quer ver o Troy? O Zac Efron? A cara dela piorou: “Aquele bobo do Troy? Blergh…”
Tinha um príncipe novo no pedaço: Edward Cullen de “O Crepúsculo” acabara de chegar para destruir tudo! O bobinho do Troy não tinha como resistir aos super poderes de um vampiro branco-cadáver que brilhava no sol e fazia Bella voar pelas árvores… Minha sobrinha não parava de crescer poxa, e eu continuava obrigado a crescer junto…
Entre uma e outra sessão de “Lua Nova”, ainda existia espaço para “Coragem o Cão Covarde”, ríamos muito.. . O Jack de Tim Burton sempre marcou presença. De minha parte a influenciei com filmes de horror e outras bizarrices… Ainda me lembro do dia que ela me chamou toda animada gritando: “…vem ver vem ver, eles arrancam as cabeças das pessoas no filme…!” Que Meigo!
Toda minha relação com ela está completamente envolta com filmes, desenhos, histórias… Me trai sempre vendo filmes com outras pessoas, mas sempre vem me contar o que achou…e eu adoro.
Estou aqui agradecendo sua companhia, seu olhar, sua alegria por 11 anos vendo filmes comigo… Espero sempre ansioso pelas transmutações que seu gosto ainda vai passar dia após dia. Nossa jornada de cinéfilos sobrinha-tio nunca vai acabar… filme por filme, frame por frame, sonhamos e viajamos juntos por todos os lugares que a imaginação humana pode alcançar e além.
Parabéns Karu!

Já me vi cantando Barney com emoção com minha sobrinha. Aquele bicho rosa sem sentido fazia todo o sentido do mundo pra mim. Mas chegou um dia em que falei para ela: “Vamos ver Barney? “ e ela fez cara de horror tipo “Eu não quero ver essa bobeira”.